É apresentada a seguir uma avaliação teórica do impacto entre a frente de
um automóvel e a traseira de um caminhão equipado com pára-choques rígido.
O equacionamento aqui apresentado foi
baseado inteiramente no trabalho de RECHNITZER [1].
O impacto entre dois veículos pode ser
descrito matematicamente pelo emprego das leis do movimento e das leis físicas
que governam o impacto.
Impacto centrado
Cálculo das forças em impactos camião - automóvel:
Considerações:
·
Os veículos estão se movimentando na mesma linha reta;
·
O impacto é essencialmente plástico, com os veículos não sofrendo
deslocamento lateral;
·
Após o impacto os veículos permanecem em contato com uma massa combinada (m1 + m2) e uma velocidade v3, seguindo na mesma linha
reta.
Definição das variáveis:
s = deformação total do automóvel (m)
m1 = massa do caminhão (kg)
m2 = massa do automóvel (kg)
v1 = velocidade do caminhão antes do impacto (m/s)
v2 = velocidade do automóvel antes do impacto (m/s)
v3 = velocidade pós impacto dos veículos (m/s)
va = velocidade de aproximação dos veículos = v1 + v2 (m/s)
F = força média agindo nos dois veículos no impacto (N)
E = energia cinética (J)
m1 = massa do caminhão (kg)
m2 = massa do automóvel (kg)
v1 = velocidade do caminhão antes do impacto (m/s)
v2 = velocidade do automóvel antes do impacto (m/s)
v3 = velocidade pós impacto dos veículos (m/s)
va = velocidade de aproximação dos veículos = v1 + v2 (m/s)
F = força média agindo nos dois veículos no impacto (N)
E = energia cinética (J)
Pela conservação da quantidade de
movimento, tem-se:
m1 v1 + m2 v2 = (m1 + m2) v3 (1)
v3 = (m1 v1 + m2 v2)/ (m1 + m2)
(2)
A energia cinética dos dois veículos antes do impacto é:
E0 = 0.5(m1 v12 + m2 v22)
(3)
Após o impacto, a energia cinética dos veículos será:
E1 = 0.5(m1 + m2)v32 (4)
A perda de energia no impacto é dada por:
(5)
Substituindo a velocidade relativa de aproximação entre os veículos va=(v1+v2):
(6)
(energia perdida durante a colisão)
Cálculo da força média F agindo entre os
veículos para uma dada deformação s.
O trabalho realizado pela força F (F.s) é
igual à energia perdida no impacto:
Fs = D E = E1 – E2 (7)
(8)
Substituindo-se (8) em (6):
(9)
(Força média agindo entre os dois veículos)
A equação (9) mostra que a força média de
impacto é função não somente da massa do caminhão, mas também da massa do
automóvel, da velocidade relativa entre os veículos e da deformação do
automóvel (considerando-se pára-choques rígido).
Para verificar a influência da massa do
caminhão na força agindo entre os veículos durante a colisão, vamos considerar
três tipos de automóveis com massas diferentes ("pequeno",
"médio" e "grande"). Para cada tipo consideraremos um
modelo nacional e outro estrangeiro. Os dados referentes aos veículos nacionais
foram fornecidos por uma das montadoras instaladas no Brasil. Os dados
referentes aos automóveis estrangeiros foram obtidos no site da NHTSA (National Highway Traffic Safety Administration) dos Estados Unidos da
América [2].
A tabela I apresenta os dados utilizados
nos cálculos (dados obtidos em impacto centrado contra barreira rígida):
Tabela I – Dados obtidos em impactos contra barreira rígida, utilizados no
cálculo da força média desenvolvida no impacto.
Veículo
|
massa (kg)
|
deformação
(m)
|
velocidade
de impacto (m/s)
|
Dahiatsu
Charade
|
1.015
|
0,3861
|
13,33
(48 km/h)
|
Chevrolet
Beretta
|
1.442
|
0,5105
|
|
Buick
Century
|
1.749
|
0,587
|
|
Nacional
pequeno
|
1.100
|
0,511
|
13,89
(50 km/h)
|
Nacional
médio
|
1.350
|
0,497
|
|
Nacional
grande
|
1.750
|
0,816
|
A tabela II a seguir mostra a variação da força média no impacto em função
da massa do caminhão, para os seis automóveis considerados:
Tabela II – Forças médias desenvolvidas no impacto em função da massa do
caminhão.
Massa do
caminhão
|
3.500 kg
|
5.000 kg
|
10.000 kg
|
20.000 kg
|
40.000 kg
|
Dahiatsu
Charade
|
181 kN
|
194 kN
|
212 kN
|
222 kN
|
228 kN
|
Chevrolet
Beretta
|
178 kN
|
195 kN
|
220 kN
|
234 kN
|
243 kN
|
Buick
Century
|
177 kN
|
196 kN
|
225 kN
|
244 kN
|
254 kN
|
Nacional
pequeno
|
158 kN
|
170 kN
|
187 kN
|
197 kN
|
202 kN
|
Nacional
médio
|
189 kN
|
206 kN
|
231 kN
|
245 kN
|
253 kN
|
Nacional
grande
|
138 kN
|
153 kN
|
176 kN
|
190 kN
|
198 kN
|
A tabela II mostra que a força média desenvolvida no impacto não varia
consideravelmente com a massa do caminhão. No pior caso (Buick Century), um
aumento de cerca de 1.000% na massa do caminhão produz um aumento de apenas
43,5% na força. A tabela mostra também pequena influência da massa do
automóvel. Na verdade, este fato é resultado da maior deformação que apresentam
os veículos maiores. O mesmo não se aplica a veículos do tipo "van",
que possuem massa elevada mas provavelmente apresentam uma rigidez frontal
muito maior que outros automóveis de massa equivalente.
Os valores apresentados na tabela
referem-se às forças dinâmicas médias desenvolvidas durante o impacto. Essas
forças são maiores do que as cargas estáticas necessárias para produzir a mesma
deformação, em virtude do encruamento sofrido pelo material.
BEERMANN [3] calculou experimentalmente a relação entre as forças dinâmicas e
quase estáticas necessárias para deformar estruturas semelhantes à estrutura
frontal dos automóveis e, dentro do intervalo de 30 a 50 km/h, obteve valores entram
1,30 e 1,56 (com um valor médio de 1,40). Dividindo-se os valores da tabela II
por este fator (1,40), obtém-se as cargas estáticas correspondentes às cargas
dinâmicas calculadas. Estas cargas estáticas estão indicadas na tabela III.
Tabela III – Cargas estáticas equivalentes às forças médias desenvolvidas
no impacto listadas na tabela II.
Massa do
caminhão
|
3.500 kg
|
5.000 kg
|
10.000 kg
|
20.000 kg
|
40.000 kg
|
Dahiatsu
Charade
|
129 kN
|
139 kN
|
151 kN
|
159 kN
|
163 kN
|
Chevrolet
Beretta
|
127 kN
|
139 kN
|
157 kN
|
167 kN
|
174 kN
|
Buick
Century
|
126 kN
|
140 kN
|
161 kN
|
174 kN
|
181 kN
|
Nacional
pequeno
|
113 kN
|
121 kN
|
134 kN
|
141 kN
|
144 kN
|
Nacional
médio
|
135 kN
|
147 kN
|
165 kN
|
175 kN
|
181 kN
|
Nacional
grande
|
99 kN
|
109 kN
|
126 kN
|
136 kN
|
141 kN
|
Média
|
122 kN
|
133 kN
|
149 kN
|
159 kN
|
164 kN
|
De acordo com os cálculos apresentados acima, um pára-choques traseiro de
caminhão capaz de suportar o impacto a 50 km/h de um hipotético veículo médio deveria ser dimensionado para resistir às
seguintes cargas estáticas na direção das longarinas do caminhão (P2):
Tabela IV – Resistência do pára-choques na direção das longarinas do
caminhão necessária para resistir a um impacto a 50 km/h.
Massa do
caminhão
|
< 5
ton.
|
5-10 ton.
|
10-20 ton.
|
20-40 ton.
|
Resistência
estática do pára-choques na direção da longarina do caminhão (P2)
|
133 kN
|
149 kN
|
159 kN
|
164 kN
|
Impacto em offset
Infelizmente não foram obtidos até o
momento dados que permitam uma estimativa das forças em caso de colisão em
offset. Neste tipo de impacto as forças tenderiam a ser ligeiramente menores,
pois além de impulsionar o caminhão para a frente, o automóvel tenderia a
adquirir um movimento de rotação. O cálculo da força de acordo com a
metodologia apresentada acima exigiria o conhecimento do momento de inércia dos
automóveis, valor este difícil de se obter. Também não foi possível obter dados
de crash tests centrados e em offset que tenham sido realizados com o mesmo
veículo e à mesma velocidade, dados estes que permitiriam uma comparação entre
as forças geradas em cada caso.
Os dados disponíveis referem-se a testes
de pára-choques realizados por RECHNITZER et al. [4] e MARIOLANI et al. [5].
Ambos projetaram e construíram pára-choques baseados nas cargas estáticas
recomendadas por BEERMANN [3], ou seja, 150 kN na direção das longarinas (P2)
e 100 kN no centro (P3) e próximo às extremidades dos pára-choques
(P1), e ambos os projetos foram bem sucedidos em crash tests.
O pára-choques de Rechnitzer et al.,
instalado em um caminhão com massa de 10.000 kg, foi capaz de resistir aos
impactos em offset e centralizado de automóveis com massa de 1.420 kg a 50
km/h, e o pára-choques de Mariolani et al. resistiu ao impacto em offset de um
veículo com massa de 1.200 kg a 50 km/h.
Os resultados desses testes permitem supor
que uma relação de 3:2 entre as resistência estática na direção das longarinas
e a no centro e extremidades do pára-choques é satisfatória.
Baseado na Tabela IV, esta relação (3:2)
permite construir a seguinte tabela (pára-choque capaz de resistir a um
hipotético automóvel MÉDIO a50
km/h:
Tabela V – Sugestão dos valores de resistência estática do pára-choque.
Massa do caminhão
|
< 5 ton.
|
5-10 ton.
|
10-20 ton.
|
20-40 ton.
|
Resistência estática próximo às extremidades (P1)
|
90 kN
|
100 kN
|
105 kN
|
110 kN
|
Resistência estática na direção da longarina (P2)
|
135 kN
|
150 kN
|
160 kN
|
165 kN
|
Resistência estática no centro do pára-choque (P3)
|
90 kN
|
100 kN
|
105 kN
|
110 kN
|
Referências
1. RECHNITZER, G. – "Design Principles for Underride Guards and Crash
Test Results". Notes for SAE Heavy Vehicle Underride Protection TOPTEC,
April 15-16 1997, Palm Springs, USA.
2. NHTSA (National Highway Traffic Safety Administration) Vehicle Crash Test
Database. URL: http://www-nrd.nhtsa.dot.gov/database/nrd-11/veh_db.html
3. BEERMANN, H.J. – "Behaviour of Passenger Cars on Impact with Underride
Guards". Int. J. of Vehicle
Design, vol. 5, nos. 1/2, pp. 86-103, 1984.
4. RECHNITZER, G.; SCOTT, G. & MURRAY, N.W. – "The Reduction of
Injuries to Car Occupants in Rear End Impacts with Heavy Vehicles". SAE
Paper 933123. 37thStapp Car Crash Conference Proceedings, San
Antonio, Texas, USA, November 8-10, 1993.
5. MARIOLANI, J.R.L.; ARRUDA, A.C.F; SANTOS, P.S.P; MAZARIN, J.C. &
STELLUTE, J.C. – "Design and Test of an Articulated Rear Guard Able to
Prevent Car Underride". SAE Paper 973106. VI International Mobility
Technology Conference and Exhibit, São Paulo, Brasil, October 27-29, 1997.
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