29/03/14

Quase Doutor:

   Quase Doutor:
Era uma tarde como tantas outras, naquele ano de 1972, brincava com os meus irmãos junto aos muros do cemitério, sem perceber muito bem porque parou um carro e como quem apanha animais abandonados, meteram – nos dentro, a mim a Toninha (Antónia) e a Manuela eu com 8 anos a Antónia com 5 e a Manuela com algumas semanas, a única coisa que ouvimos veio do outro lado da de estrada de terra batida, de um trabalhador da fabrica de madeiras: Lá vão os filhos da Maria! Depois de percorridos alguns quilómetros, param o carro e passaram-nos para um outro, a única diferença foi que aqui meteram uns sapatos nos pés, recordo-me bem, um só dava para os dois pés, iniciamos nova viagem, muitas mesmo muitas horas depois pararam o carro num sitio completamente desconhecido para mim e tiraram as minhas irmãs.
Fiquei ali alguns minutos a chorar porque sem saber o que estava a acontecer senti que seria a ultima vez que as via, depois, depois o casal regressou ao carro e nova viagem, mais alguns quilómetros e ouvi a mulher dizer:
-É aqui! Olha o número! Da porta, sai, puxado pela mão do homem, que apenas disse saí…
Depois de tocarem numa campainha em forma de sino abriu-se aquele enorme portão e surgiu um homem baixo gordo e careca aquém faltava o dedo médio da mão direita:
Ah já sei! É este? Pode deixar!
Passaram-se algumas semanas e nunca mais ouvi dizer nada da minha família, apenas me foi transmitido pelo Sr. director que o meu pai tinha morrido e a minha mãe me tinha abandonado. Da morte do meu pai eu sabia, do abandono da minha mãe foi novidade para mim. Ate porque naquele dia trabalhava na padaria como tos os outros dias.
Talvez passado um ano +- chegam dois indevidos ao colégio , que me perguntaram  depois de se terem apercebido que eu não tinha visitas.
Porque não vem cá ninguém visitar-te? E porque te chamam Amarante, depois de lhes contar a historia, e dar a explicação de me chamarem Amarante.
 Replicou um deles, Isso é fácil Pá! Se moras perto da Igreja e és de Gondar, Amarante, mandamos uma carta a tua mãe e ela vem cá buscar-te! Mas eu não sei a direcção! È fácil!
Escrevemos:
 Lugar da Igreja Gondar Amarante e vai lá ter, Ate aposto!
 Passados muitos meses de luta na tentativa de me tirar de lá, só com ajuda do MFA (Movimento das Forças Armadas) a minha mãe, troou-se-me de volta. Já em casa a minha mãe colocou uma toalha branca no lavadouro do tanque e com um pente próprio para o efeito varreu-me centenas de vezes a cabeça e de cada passagem caíam dúzias de parasitas (piolhos) que a minha esmagava com a unha contra a toalha, não foi preciso muito tempo para que o branco da toalha desse lugar a um castanho ensanguentado. Pega nesta toalha e leva a casa do Sr. Padre! Que ele disse que quando vos levou, vocês só saíam de lá com o diploma de Doutor! Vai lá mostra-lhe o teu diploma!  
A meio do caminho deite aquela porcaria ao chão e voltei para casa a minha mãe deve ter visto porque não me perguntou nada.
O meu padrinho que morava em Gaia encontrou as minhas irmãs numa outra instituição passados 2 anos. Eu voltei a velas uma com 16 e a outra com 11 anos.

Nota: a Antónia vive em França tem 3 filhos e trabalha numa instituição igual á que esteve. A Manuela vive na Chuiça e tem 1 filho.
Eu sou vendedor e estou desempregado. E o único diploma que tenho diz:
Rodrigo Luís Monteiro de Oliveira 51 B – 1009, frequentou o curso de Tripulantes de Ambulância do INEM que decorreu de 16 de Outubro a 17 de Novembro de 1989 com bom aproveitamento.
(escrevi como sei e com muita dor e muitas lágrimas à mistura Desculpem)

30/05/2007
Passou no programa Historia de Vida na Antena 1 no dia 4/9/200
 Rodrigo Oliveira – Amarante










  



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